Não se Engane! Ainda Não Nos Livramos Totalmente da Propina Cultural

Eduardo Martins*

Reproduzo abaixo texto de artigo escrito por Bruno Mello, fundador e Editor do canal Mundo do Marketing, cujo tema ressuscitou a lembrança de que a prática de gerentes ou diretores de empresas solicitarem propina para aprovarem projetos culturais não está morta.

Seu depoimento revela o testemunho de quem vivenciou práticas reprováveis dentro de seu campo de trabalho que abrange, também, o patrocínio à cultura e ações socioculturais.  

Ao citar ocorrências vividas pouco edificantes, lembrei-me que testemunhei, e ouvi depoimentos, de outras que fariam gelar o coração de quem foi induzido, ou escolheu preservar dentro de si, os melhores valores humanos. 

E não são somente os produtores que ainda precisam lidar com a “contrapartida” persistente para verem seus projetos aprovados – as organizações sociais, que necessitam de dinheiro para exercer suas atividades ligadas à cultura, ao esporte, ou mesmo à assistência social, convivem há algum tempo com verbas oriundas de emendas parlamentares, potencializadas agora pelas “emendas pix”.

Mas elas, em geral, para receber, têm um preço a pagar – quem é dirigente de entidades sem fins lucrativos sabe que, se quiser o benefício, estará sujeito a um “pedágio” alto, chegando, em alguns casos, a 50% da verba repassada. Prefeituras também se submetem a esse cerco.

E não é só a propina que ilustra o pouco apreço pelo dinheiro público. Mesmo projetos escolhidos via edital subvertem o propósito por falta de fiscalização. De um proponente, cuja proposta aprovada previa atendimento a 200 crianças para aulas de música, respondeu com um “todo mundo faz isso” ao ser questionado por que havia emitido nota de compra para instrumentos musicais cedidos gratuitamente por outra entidade.

É certo que esses fatos não acontecem em todas as situações e também é certo que o número de ocorrências de dirigentes de empresas pedirem contrapartidas pessoais diminuiu muito frente ao que era, especialmente as que envolvem incentivos fiscais.

Porém, mais certo ainda, é que a persistente e indecente prática dessas “contrapartidas” no mundo corporativo, e a escandalosa marcha crescente de verba para emendas parlamentares, entre tantos outros exemplos do dia a dia nessas e outras áreas, só confirmam a sensação de que, infelizmente, o Brasil continua sendo uma Nação moralmente enferma.

Acompanhe, abaixo, o artigo de Bruno Mello.

“O assunto do momento no mundo do Marketing é a saída de Eduardo Tracanella do cargo mais alto do Marketing do Itaú. Os jornais Valor Econômico e Brazil Journal noticiaram na sequência que a demissão teria sido por conta do mau uso do cartão de crédito corporativo e confirmado pelo banco em comunicado interno aos quase 300 colaboradores do departamento de Marketing do Banco. Hoje (04/12), o banco oficializou o motivo.

Bruno Mello

Outras fontes noticiaram, também, que o executivo teria tido vantagens indevidas em contratos da área. Uma coisa é fato: algo de muito errado aconteceu – afinal, um executivo e sócio não sai da noite para o dia dessa posição – e o tempo vai dizer como já aconteceu em outras ocasiões. Agora, eu te pergunto: qual é a novidade? Nenhuma. E não estou falando deste caso Tracanella e Itaú.

Infelizmente, o Marketing segue sendo uma área muito suscetível à corrupção. De novo: não estou falando do caso Tracanella e Itaú, mas de inúmeros casos que muito de nós sabemos e vivemos na pele. Vou te contar uma: o ano era 2007. Eu tinha 25 anos e o Mundo do Marketing caminhava para o seu segundo ano. Uma executiva comercial disse que conseguiria um patrocínio muito bom de uma grande marca caso oferecêssemos “uma comissão” a mais duas pessoas. Na mesma hora, a demitimos.

Antes disso, em uma área de comunicação em que trabalhei, vi notas e notas fiscais de gráficas sendo usadas para servirem de prestação de contas de materiais que nunca foram impressos. Corta para 2024 e o que temos visto é a cena se repetir em casos de “agrados” recorrentes que ainda acontecem. Já ouvi de diversos executivos sobre as ofertas de corrupção que eles recebem praticamente todos os dias para aprovar um projeto, uma verba, um patrocínio, um serviço e até um mísero convite para eventos.

Enquanto isso, há um grande esforço das empresas (ou pelo menos um discurso) na questão de governança corporativa. Ironicamente, em muitas delas, é o Marketing quem comanda ou está muito envolvido em iniciativas sociais, sustentáveis e de governança – o famoso ESG. Quanta hipocrisia, não?

O Marketing é a área em que temos contato e vemos essas coisas acontecerem, mas infelizmente vivemos em um país em que essas práticas não são “privilégio” do Marketing. Já vi extrato bancário de escritório de advocacia fazendo pix para desembargador. É triste e é um problema endêmico da nossa sociedade.

Casos como o que aconteceu com Tracanella e Itaú, sendo verdade ou não o que vem sendo alastrado, infelizmente, devem servir de aprendizado para que os profissionais de Marketing e a extensa cadeia de fornecedores da área realmente tenham uma mudança de postura”.

Bruno Mello é fundador e Editor Executivo do Mundo do Marketing, Jornalista com MBA em Marketing.

* É Editor-Chefe de VALOR CULTURAL/Marketing Cultural, que têm entre seus propósitos dar visibilidade a bons projetos ou ações, valorizar empresas que praticam patrocínios conscientes e apontar aquelas que fingem ser o que não são no campo da Responsabilidade Social.

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