Google, Facebook, Netflix. Como Essas Plataformas Utilizam Lei de Incentivo?

Eduardo Martins*

 

No dia 14 de dezembro de 2024 a Netflix, maior plataforma de “streaming” das que atuam no Brasil, depositou a quantia de 5 milhões de reais para Obras de Restauração e Modernização do Complexo Histórico da Cinemateca Brasileira. Não ficou sozinha, mas foi majoritária na captação alcançada pela Cinemateca naquele ano em que teve a companhia do Itaú por meio de duas subsidiárias: Itaú BBA e Redecard, agora conhecida como Rede. Ambas completaram outro milhão.

Foi a primeira vez que a Netflix utilizou a lei federal de incentivo (Rouanet) para patrocinar projeto, mas outras companheiras desse nicho de mercado possuem histórico de utilização da lei.

Facebook, por exemplo, por meio do Facebook Serviços Online do Brasil, usa esse mecanismo desde 2017 e em 2024 aplicou R$ 5,2 milhões, embora para apenas duas iniciativas: o Plano Anual de Atividades do Museu das Favelas e o Plano Anual Interartis, proposto pela Associação de Gestão Coletiva de Artistas Autores e Intérpretes do Audiovisual do Inter Artis Brasil.

Para o primeiro destinou R$ 3,2 milhões e os R$ 2 milhões captados pela Inter Artis foram do Facebook.

O número de 2024 é bem maior do que o investido em 2023 (R$ 2,1 milhões), porém menor do que os R$ 7 milhões de 2022.

Ao todo já aplicou R$ 28,8 milhões em 30 projetos com lei Rouanet. Ao longo do percurso, desde 2017, demonstrou preferência por apoiar organizações culturais tradicionais e estabelecidas, como a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP) e grandes museus.

Há registros de projetos de impacto e cidadania como Nas Trilhas da Cidadania, Retratos da Cidadania e Mulheres em Foco, além de Festivais e Eventos Culturais como São João Cultural de Caruaru e Festival Nacional de Teatro, entre outros.

Existia certo balanço entre o apoio à cultura tradicional (museus, orquestras) e iniciativas voltadas à cultura digital e novas tecnologias, como o Festival de Cultura Digital e projetos relacionados ao metaverso.

Abrangeram diferentes regiões do Brasil, incluindo São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco (Caruaru) e Sergipe, não se limitando apenas às capitais.

Mas em 2024 não foi assim. A estratégia de patrocínio cultural do Google via Lei Rouanet revela preferência por projetos que aliam tecnologia, inovação e sustentabilidade ambiental, com destaque para iniciativas relacionadas à Amazônia. Diferentemente do Facebook, o Google demonstra investimento mais expressivo no setor audiovisual, especialmente em festivais de cinema consolidados.

Os padrões de investimento sugerem uma política de patrocínio que busca equilibrar o apoio a instituições culturais tradicionais com iniciativas de impacto social, diversidade e inclusão. O foco em projetos que integram cultura e tecnologia alinha-se com a identidade corporativa do Google como empresa de tecnologia.

Google Brasil e Google Cloud apoiaram conjuntamente 23 projetos culturais através da Lei Rouanet, totalizando R$ 27,19 milhões. Destes, 20 projetos foram patrocinados diretamente pelo Google Brasil (R$ 25,36 milhões) e 3 projetos pelo Google Cloud (R$ 1,83 milhão).

Porém houve diferenças entre 2023, primeiro ano em que começou a utilizar o incentivo, e 2024.

Em 2023 foram apoiados 10 projetos como Engenhoka | Estúdios de Arte, Tecnologia e Ciência (Distrito Federal, replicado também em 2024), 33º Cine Ceará – Festival Ibero-americano de Cinema, Perifacon – A Primeira Convenção Nerd das Favelas (São Paulo), Amazônia das Palavras (Rondônia), Festival Social Good Brasil 2023 (Santa Catarina), Instituto São Paulo de Arte e Cultura  e planos anuais de Vaga Lume e OSESP. Valor aplicado no ano foi R$ 17,5 milhões.

Já em 2024 o número de projetos patrocinados aumentou (12) com a inclusão do Google Cloud, que impulsionou três ações: Orquestra Maré do Amanhã, Vaga Lume e OPESP.

Entre as ações apoiadas via Google Brasil estiveram Guardiãs do Futuro – As Mulheres Que Lutam Pelo Meio Ambiente (São Paulo), MASP, Museu da Ciência e 52º Festival de Cinema de Gramado.

A relação da vida útil da Microsoft com lei federal de incentivo durou apenas seis anos – de 2014 a 2019.

Começou destinando R$ 620 mil para o plano anual da Fundação Bachiana Filarmônica e terminou complementando com R$ 1,6 milhão os R$ 875 mil enviados à XIX Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro no ano anterior.

Nesse meio tempo prestigiou, durante três anos consecutivos, o Luz, Câmara, Ação Social, programa proposto pelo Instituto Criar de TV e Cinema e, entre outras ações, enviou R$ 300 mil para o plano anual do Instituto Gerando Falcões.

Foram 15 projetos patrocinados, sendo quatro deles via Microsoft Informática em apoio a outros financiados pela Microsoft Brasil.

O total aplicado pelas duas empresas, durante aquele período, foi R$ 9,4 milhões.

A partir de 2020 foi zero.

CASO CURIOSO – Entre todas as plataformas de TV sob assinatura, a HBO foi a primeira a utilizar a lei federal de incentivo para auxiliar um projeto cultural.

Em maio de 1997 apoiou a realização do Seminário de Cinema e Televisão do Mercosul (ex Seminário Internacional sobre Cinema e Televisão).

Esse evento foi proposto pela Fundação de Amparo a Pesquisa e Extensão Universitária, que conseguiu do Pronac aprovação de R$ 913 mil para sua realização, mas sob o Artigo 26 da lei Rouanet, que só oferece cerca de 64% de abatimento do valor aplicado do Imposto de Renda.

Projeto, porém, só teve apoio da HBO, que destinou ao proponente a módica quantia de R$ 10 mil.

Mesmo assim, ele o realizou e apresentou prestação de contas.

E a HBO nunca mais voltou ao patrocínio.

*É Editor-Chefe de VALOR CULTURAL/Marketing Cultural, que têm entre seus propósitos dar visibilidade a bons projetos ou ações, valorizar empresas que praticam patrocínios conscientes e apontar aquelas que fingem ser o que não são no campo da Responsabilidade Social.

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