Entenda Por Que a Vale Não Quer Ser Só Patrocinadora

Eduardo Martins*

 Diretor do Instituto Cultural Vale detalha, em longa entrevista, como pensa, age e o que deseja ser o maior patrocinador da cultura brasileira.

Nenhuma pergunta ficou sem resposta. Humildemente orgulhoso Hugo Barreto traçou com várias linhas o que metaforicamente pode ser classificado como o mais completo Raio X de uma instituição criada recentemente com um firme e único propósito específico: fomentar a cultura brasileira.

De que forma? Ele explica. Como? Ele explica. Objetivos? Ele explica. E destampa sem receio a caixa de onde jorram milhões em patrocínio. De que jeito? Ele explica.

Hugo quer implantar agenda efetiva de fomento no sentido mais amplo do termo (Foto de Marcelo Bravo)

Gostei de fazer essa entrevista com o Diretor Presidente do Instituto Cultural Vale por vários motivos, entre eles poder abaná-la diante de muito gerente ou diretor de marketing que se nega a revelar os valores com que financiam projetos com renúncia fiscal sob o tosco argumento de que “não falamos sobre números”, como se não houvesse o dever moral de fazê-lo numa época em que se apregoa transparência como símbolo de Governança com a agenda ESG, mas que desaparece quando se usa lei de incentivo.

Porém, há várias outras razões mais importantes do que essa para classificar como imperdível esse diálogo, traduzido em grande parte logo abaixo.

Como prévia do conteúdo, criamos um resumo em tópicos, um aperitivo, para indicar o mais relevante em termos de esclarecimentos e motivações surgidos nessa quase uma hora de conversa.

O que motivou a criação do Instituto Cultural Vale e qual é a estratégia adotada para alcançar seus objetivos

Que entre eles está fomentar a cultura brasileira não só por meio do apoio financeiro, mas também do apoio técnico e da articulação

Fortalecer a produção cultural nos territórios onde atua, com ênfase no Norte, Pará e Maranhão e extensão para Minas, Espírito Santo e Rio de Janeiro

Que o fortalecimento dos territórios onde atua se dá pela via de aumento do patrocínio, mas também pela circulação, novidade introduzida

Capacitar micros e pequenos produtores a montarem um projeto, apresentá-lo para obter benefício da lei Rouanet e também para potenciais patrocinadores que não apenas a Vale

Explicação para o valor reservado para edital público ser tão pequeno frente ao montante aplicado com lei federal de incentivo

Detalhes sobre como é o processo de recebimento de projetos, análises, metodologia, prazos, inclusive para aqueles fora do edital e apoiados de forma direta

Razão por que projetos de cinema e audiovisual não são contemplados via chamada pública

E comprometimento para tornar o site do Instituto ainda mais transparente quanto aos investimentos diretos e incentivados, política de patrocínio, critérios envolvidos e formas de acesso para encaminhamento de propostas.

EDIÇÃO – A entrevista foi separada em blocos para melhor entendimento. Nela há trechos editados e alguns resumidos, mas cada bloco está acompanhado de gravação em áudio com seu conteúdo completo.

No final dessa matéria há link para quem quiser ouvir a conversa, sem cortes, com todos os diálogos.

Participaram da entrevista, além de Hugo Barreto, a analista especialista em patrocínio do Instituto Cultural Vale, Marize Mattos, e Ana Beatriz Mauro, consultora de comunicação.

Além de ser Diretor Presidente do Instituto Vale e da Fundação Vale, Hugo é também Diretor de Sustentabilidade e Investimento Social da empresa.

Sobre os eixos e o que é o Instituto

 

A pergunta versou sobre a criação do Instituto Cultural Vale e suas motivações. No áudio ele também faz um resumo de seu currículo.

HUGO BARRETO – Qual foi a inflexão que o eixo da cultura que a Vale vem fazendo? Primeiro consolidar o que ela já fazia, dentro de um veículo chamado Instituto Cultural Vale, organizando estrutura com uma expertise e juntando esses núcleos que atuavam, dentro de uma mesma área na Vale, buscando integrar mais. E, ao fazer isso, revisando o seu papel e, na minha visão, acho – você, que está olhando de fora, com um olhar especializado, se puder nos dar algum feedback da sua percepção, independente da entrevista e da matéria, eu agradeço, é sempre bom – que o que a gente está tentando fazer está começando a ficar perceptível.

Entender que uma organização como essa não é uma organização de patrocínios exclusivamente, não é um cofrinho, sem deixar de ser uma instituição de patrocínios, é óbvio. Hoje nós somos o maior patrocinador de cultura do País. No ano passado a gente aportou cerca de R$ 370 milhões, mas isso não é o mais relevante e também foi pela oportunidade que nós tivemos com lei Rouanet, além de recursos orçamentários, como por exemplo o que a gente está aportando no Museu Nacional sem incentivo, sem renúncia fiscal, assim como em outros projetos como na Cinemateca brasileira, que foi reinaugurada agora em maio. A gente fez um aporte de R$ 700 mil para viabilizar a reabertura e estamos negociando o apoio a projeto do acervo em celulose da Cinemateca.

Mas o que a gente quer nessa narrativa? O que a gente é? Primeiro a gente fez uma imersão para constituir essa estratégia dois anos atrás para poder inaugurar o Instituto. E a nossa estratégia passa por fomentar a cultura brasileira por meio do apoio financeiro, mas também do apoio técnico e da articulação, numa agenda efetiva de fomento no sentido mais amplo da palavra fomento.

Exemplo: a gente se aproxima do Museu Nacional não apenas com recursos financeiros, mas também com uma proposta de constituir um comitê executivo chamado Museu Nacional Vive, onde hoje tem assento a UNESCO, o Marcelo Araújo como expert da sociedade civil, o Instituto Cultural Vale, representado pela minha pessoa e mais uma pessoa, a reitora da Universidade e o Kellner, diretor do Museu.

Ali a gente discute tudo do Museu. A chamada pública dos arquitetos, a modelagem, que tipo de arquiteto a gente quer convidar, que tipo de narrativa de conteúdo, não entrando no conteúdo especificamente, mas nas estratégias macro de cada uma dessas questões. Ajudamos a buscar outros parceiros, o BNDES está junto nesse Comitê, o Bradesco também está conosco, até mobilizado que foi pela Vale porque é acionista e foi convidado a aderir ao projeto e aderiu com muita ênfase. Então a gente vem se colocando como um agente de fomento, além de recurso de patrocínio. É óbvio que a gente não faz isso em 170, 150 projetos que a gente patrocina, mas a gente faz onde se faz necessário e onde faz sentido.

Então um dos eixos é esse. É um outro metabolismo de atuação cultural combinando patrocínio, articulação e apoio técnico.

O segundo eixo é o de fortalecer a produção cultural nos territórios onde a Vale atua, com muita ênfase no Norte, Pará e Maranhão. Porque em Minas e Espírito Santo, onde a gente já atua, tem, cada uma na sua escala, uma estrutura de produção cultural mais forte, por razões óbvias, e Rio de Janeiro, que é a nossa sede e a gente entende que é nosso território.

Memorial Minas Gerais Vale. Criado e mantido pela Fundação Vale. Integra o Circuito Cultural Praça da Liberdade, na capital mineira. Foto: Marcelo Coelho

No entanto a gente olha para todo o Brasil porque a gente é uma empresa brasileira, internacional, que atua em 23 países, mas tem um entendimento de olhar e contribuir para o desenvolvimento da cultura do País como um todo, mas com essas ênfases. E aí a gente vem incrementando… por exemplo no Pará, esse ano, se não me engano, a gente subiu de sete a oito projetos patrocinados para 40. De que forma? Nem todos são paraenses, ou são maranhenses, mas a gente está fazendo, e acabei de citar a Bienal… nós vamos te apoiar com uma cota importante, mas precisamos levar esse conteúdo maravilhoso para lugares que vocês nunca levariam. Então a Bienal, que está lá no Pará desde o início de abril, com temporada de cerca de dois meses e meio; como não coube em nosso Centro Cultural, em articulação com a Prefeitura e com a Fundação Cultural do Município de São Luís, expandimos a presença da Bienal para a Casa do Maranhão, que é outro Centro Cultural ali no centro histórico vizinho.

Isso acaba sendo uma irradiação de nossa agenda pra fora e contribuindo para fortalecer.

Então esse é o segundo eixo, de fortalecimento dos territórios onde atuamos, pela via de aumento do patrocínio e pela via da circulação, e isso foi uma novidade que a gente introduziu, em circulação e intercâmbio e, o terceiro, pela capacitação dos pequenos produtores culturais, que é uma atividade que eu chamo aqui internamente de gabinete de projetos. Para ajudá-los, especialmente esses micros e pequenos produtores, a montar um projeto, apresentá-lo na lei Rouanet e também apresentar para potenciais patrocinadores que não apenas a Vale.

A outra dimensão é a gente fazer um processo neutro de apoio a patrocínios através da chamada cultural. Então, do nosso potencial de lei Rouanet, seja ele do tamanho que for, a gente, uma parte vem dedicando a essa chamada, e ela vem crescendo, no primeiro ano foi uma loucura, a plataforma caiu com as inscrições todas; no ano passado foi um sucesso e nesse ano a gente acabou de lançar. E a gente coloca cerca de R$ 25 milhões para isso e vem aprimorando as regras a cada ano.

Uma outra via que a gente faz são editais locais, que não é a chamada pública nacional a que eu me referi, de R$ 25 milhões.

Por fim, a nossa estratégia passa por identificar aquilo que a gente, entre aspas, internamente, fala dos tesouros da arte e da cultura brasileira, que a gente tem, de alguma maneira, estar atentos, e aí eu não posso deixar de citar os já citados Museu Nacional, Orquestra Sinfônica Brasileira – e depois eu falo do eixo da música, que é um eixo importante, mas eu vou pelos temas porque ainda não falei dos temas –  Inhotim, Bienal, tem vários museus que a gente apoia e considera super relevantes e a Cinemateca, que a gente está considerando um apoio nacional, e com isso a gente trabalha um recorte de estar próximo daquilo que chamamos de projeto que todo mundo conhece e de projetos que o Brasil inteiro deveria conhecer e não conhece. É um slogan até da nossa campanha.

Bom, e falando sobre temas, ou eixos temáticos, a gente atua no patrimônio material edificado ou não edificado, imaterial. A gente apoia o eixo da música, pela via de orquestras e as novas orquestras, tem a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, tem a Orquestra de Ouro Preto, tem a Orquestra Sinfônica Brasileira, estamos apoiando um pouco a OSESP de São Paulo, apesar de não ser território, mas aí é o critério Brasil e da importância daquela referência; tem o programa Vale Música, programa nosso, de fomento, de núcleos musicais, que tem em Cuiabá, tem em Belém, tem lá em Serra, no Espírito Santo, que são maravilhosos, e a gente tem feito intercâmbio desses meninos jovens dessas orquestras com as orquestras jovens patrocinadas; fizemos um programa de residência musical para esses meninos virem aqui no Rio, para a OSB, depois fizemos uma culminância no Teatro Municipal antes da pandemia, que foi lindo, um espetáculo lindo.

Estou falando tudo isso para você entender o nosso metabolismo, como é que a gente está querendo atuar e, se isso não é 100% percebido, aos poucos acho que vai ser, e a sua matéria pode até nos ajudar a traduzir isso melhor para um universo mais qualificado, que é por onde circula o seu veículo.

Alunos do Vale Música com a Orquestra Sinfônica Brasileira no Teatro Riachuelo (Divulgação Vale)

Sobre o valor do edital ser pequeno frente ao volume total aportado

 

A chamada pública (prazo de inscrição se encerrou dia 30 de junho/22) estipulou o valor de R$ 25 milhões para beneficiar projetos enquadrados no Artigo 18 da lei Rouanet.

Há, portanto, um gap enorme entre essa quantia e os R$ 370 milhões utilizados no ano passado.

Por que esse número de chamada pública é tão pequeno em relação ao volume investido fora do edital?

HB –Primeiramente, como eu disse, 370 milhões foi uma marca que a gente atingiu pela primeira vez em dezembro. E ainda estamos vendo qual será o radar desse ano, então nós não podemos assumir um tamanho de compromisso… porque 25 milhões, quando o edital foi lançado, representava o percentual X do potencial de receita.

Segundo, a gente só é liberado para assumir valores maiores perto do último trimestre do ano. Como é que eu posso fazer um edital muito grande antes de saber se eu tenho esse recurso, e aí é um problema de procedimento e de criação de expectativas. Tem uma questão metodológica, que está ligada ao potencial de apuração, à confirmação e, principalmente, pela liberação de nossa tesouraria dessa disponibilidade, porque às vezes, além da performance da empresa, tem também as equações fiscais e tributárias de qualquer empresa. Tem um Refis, tem uma compensação. Então não é só olhar a Vale tá faturando isso ou o Bradesco tá faturando aquilo, vai ter tanto de 4% e fazer uma conta de chegada bem rápida.

Essa aproximação se dá muito pro final do ano e não há tempo hábil de a gente fazer na última hora esse edital. A gente lançou agora e vai ficar seis meses trabalhando, porque, se por um lado é mais bacana, tem uma banca técnica, tem um prazo de inscrição, tem um prazo de habilitação na lei de incentivo federal à cultura, tudo isso o que a gente prevê no edital, isso exige um calendário longo. Então essa é a primeira razão e não a única.

A segunda razão é que nós rodamos quatro museus, não apenas o que está programado dentro dele, mas essas atividades de circulação e financiamento via editais locais. Então a gente descarrega parte de nossa própria lei no financiamento desses equipamentos que são públicos. A gente atende em Vitória duas, três mil crianças por mês de escolas e recebe gratuitamente, assim como cada um deles também.

E o terceiro é que a gente tem um compromisso de longo prazo. A Vale patrocina o Inhotim há mais de 10 anos, a Vale também patrocina a OSB também há uns 10 anos. Então a gente tem compromissos de longo prazo relevantes como Círio de Nazaré, o Arte Pará, alguns museus há muitos anos e são museus importantes.

Se a gente é um Instituto que tem uma curadoria de programação própria – e aí eu volto para a primeira frase, que eu não sou um cofrinho – nós temos uma curadoria de seleção de projetos que não cabe numa chamada, pois se eu puser esses grandes projetos na chamada pública eu crio um desequilíbrio competitivo. Então a gente vai pela via do mérito também de análise técnica.

Então, se fizer uma conta um pouco mais traduzida nesses eixos, a comparação não é 25 milhões versus 300 milhões – vamos botar uma média de 300, ou 250 que é talvez nossa média mais realista, porque 370 pode ter sido um desvio do ano passado que não vai se repetir, ou pode se repetir, não sabemos, só vamos saber mais pra frente.

Então a gente está atento às grandes questões da cultura brasileira, onde a gente pode ajudar também, às vezes até numa lógica, puxa, aquilo tem um valor intrínseco em um momento que se não for agora pode depois, como foi o caso da nossa conversa com a Cinemateca, que foi um valor baixo, mas foram 700 mil reais que permitiram a reabertura dela em maio, inclusive não incentivados.

Então varia muito, Eduardo. Até peço essa ajuda como traduzir, porque quando a gente faz só essa comparação ela fica estranha realmente, não posso discordar de você.

Sobre projetos com escolha direta

 

O Instituto mantém em seu site um cadastro para que projetos possam ser encaminhados fora do edital público, que são examinados  com vistas a um possível patrocínio direto. Hugo e Marize Mattos explicam como funciona.

HB – A gente recebe patrocínio direto numa plataforma aberta, qualquer projeto. Até por um dever de transparência e integridade, eu não recebo, às vezes as pessoas até mandam pra mim, pra Marize, mas a gente fala assim: inscreve e cadastre na plataforma. Não considere como submetido à Vale se você mandar no meu e-mail ou no meu WhatsApp. É para que a gente tenha um cadastro de todo o trâmite de análise do projeto e possa fazer qualquer devolutiva ao próprio interessado sempre que necessário.

EDUARDO MARTINS É nesse trâmite que estou interessado. Acho que a maioria dos projetos que vocês patrocinam vem por esse caminho e não tenho nem ideia de quantos projetos vocês recebem, são centenas e centenas. Eu queria saber a estrutura que vocês têm de analistas para analisar esse processo.   

Essa pergunta quem respondeu foi Marize Mattos, a analista que gerencia todo esse trâmite.  

MARIZE MATTOS – Nós recebemos via nossa plataforma, no site do Instituto Cultural Vale, projetos de todo o Brasil, mensalmente, durante o ano, e mensalmente nós fazemos uma análise em Comissão. Tem o olhar sobre se o projeto é aderente aos temas patrocinados pelo Instituto, tem um olhar também do território para ver a aderência dos projetos nos territórios e tem nossa área de compliance que avalia também todos os projetos junto com a gente. (plataforma de inscrição pode ser acessada por aqui).

Então cada projeto passa por essas instâncias de análise e aí, sendo aderente, tendo documentação e compliance, estando com a lei Rouanet, quanto à documentação conforme nossas regras internas de compliance, ele pode ser selecionado mediante, claro, a disponibilidade do recurso.

HB … E, em uma análise final, de um Comitê mais executivo do Instituto, formado por mim, pela Marize, pelas outras duas gestoras do Instituto. É claro que a gente não atende todo mundo porque alguns não se encaixam, tem problemas em alguns casos de documentação, enfim, e é isso que nos alertou: precisamos ajudar os produtores culturais a melhorarem suas proposições, seja via edital ou seja via direta, seja junto a outros patrocinadores ou seja a junto aos órgãos que habilitam os projetos, pois a gente percebeu que é uma lacuna que existe no Brasil.

MM – … Perfeito. Inclusive essa capacitação nós fizemos, disponibilizamos para produtores culturais, para auxiliá-los mesmo, pois a gente busca sempre agregar além do financeiro. Então nós temos hoje, inclusive no site, uma capacitação para produtores culturais ajudando, tanto a elaborarem seu projeto quanto inscreverem na lei federal de incentivo à cultura. (Acesso pode ser feito por aqui)

E aí, passado por essas instâncias, o edital especificamente, ele tem uma primeira instância de análise de aderência aos temas do edital e documental com vistas à questão da lei e dos nossos processos internos. Depois ele passa por uma segunda instância de análise, que é um olhar de pareceristas externos, que são especialistas nos temas do edital, especialistas na área do patrimônio, na área de música, que avaliam até para que a gente tenha uma certa isenção nessa escolha e conte com essa avaliação mais especializada em temas do edital.

Numa terceira instância, os projetos que passaram pelas duas anteriores, eles também recebem um olhar e uma análise dos nossos territórios de atuação e, por último, tem a validação desse comitê final que aí é onde se avalia também a disponibilidade orçamentária e se verifica, de acordo com o ranking de pontuação que os projetos recebem, quantos projetos a gente consegue acomodar na verba.

Sobre prazo limite para entrega de projeto fora do edital

MM – Fora do edital pode ser um pouco depois, respeitando-se aí os prazos de aprovação pelo Ministério. O ideal para nós, a fim de que a gente consiga realmente executar, é o final de outubro, onde a gente deve ter em mãos todas as propostas com a aprovação pelo Ministério do Turismo.

Sobre ausência de projetos de audiovisual e cinema no edital

 

Buscamos esclarecimento para essa questão porque a Vale utilizou cerca de R$ 9 milhões em 2021 para patrocinar projetos desses segmentos, mas eles não fizeram parte do edital.

Por que eles não foram incluídos na chamada pública? Ficou a impressão de que a empresa não apoia.

MM – Essa verba, como o Hugo falou, é uma verba que a gente não sabe ainda o valor que teremos no final do ano pela lei federal de incentivo à cultura. O edital realmente é focado em projetos da lei Rouanet, e não em projetos do Audiovisual porque a gente consegue ter controle, ter esse comprometimento de 25 milhões nesse momento, mesmo sem saber o valor total. Mas ao longo do ano, sim, como você pode constatar, nós patrocinamos projetos com a lei do Audiovisual junto à Ancine.  

HUGO COMPLETA: Não é o nosso foco principal, mas como acaba existindo essa disponibilidade pelo próprio arcabouço legal, a gente não coloca como eixo nosso, mas às vezes aparece um projeto que pode ser interessante, apareceu uma série sobre cinco documentário ou episódios sobre os objetivos do milênio, dos ODS,

A Vale utiliza leis regionais também, leis estaduais para apoiar projetos?

HB – Acho que não. Há uns tempos fizemos uma análise de ICMS e aí tem uma série de modelagens fiscais, pois a Vale, na verdade, é um grupo de empresas. Pode ser que uma vez ou outra tenha oportunidade, mas como nossa política é uma política sistemática, a gente não se utiliza disso.

Sobre foco no futuro do Instituto. Existe uma estratégia ou vai só aprimorar o que estão fazendo?

 

HB – Acho que é muito cedo para falar que queremos mudar de rumo. A nossa Vice-Presidente de Sustentabilidade, à qual me reporto, fala que o social, latu-sensu, cultura, educação, esporte,  tem um tempo próprio e que não é o tempo da produção industrial, não é o tempo dessa sociedade líquida e instantânea que a gente vem vivendo na pós-modernidade também. Tanto pelo lado corporativo quanto pelo lado da perspectiva da sociedade.

Então nós estamos no segundo ano, temos três anos, mas iniciamos, na prática, no segundo ano efetivo porque o primeiro foi um pouco piloto, e tal. Nós estamos no segundo ano e meio de uma trajetória muito importante e que, até certo ponto, vem sendo uma trajetória bem-sucedida, mais percebida aqui, menos ali, mas a gente acredita que está no caminho certo.

Uma das coisas que a gente quer reforçar muito é o eixo de formação de produtores e atores culturais, aumentar também as parcerias e a gente tem feito isso informalmente com outros patrocinadores que não vou citar, porque não estou autorizado, mas, por exemplo, você vai entrar no Museu do Pontal, eles estão precisando de 2 milhões, eu não tenho – você entra com metade e eu com metade? E a gente resolve um problema e aí não tem nada a ver se corporativamente é mais interessante pra mim entrar com mais ou menos. Às vezes é bacana ter patrocinadores para aquele museu, para aquele projeto cultural, para aquele espetáculo, em vez de ter só a Vale, ter a Vale e mais um entendeu, e vice-versa. E com isso a gente otimiza.

Sobre transparência para todo o dinheiro público investido

 

Comentei sobre bandeira antiga da revista Marketing Cultural, defendendo que as empresas só teriam vantagem se mostrassem para seu público todas as ações que estão proporcionando com uso de leis de incentivo, dizendo “usamos sim e esse é o resultado”.

Hugo respondeu sobre o que pensa a esse respeito e também sobre o que pensa sobre o uso da lei Rouanet para patrocinar projetos culturais.

HB – A gente vem fazendo um esforço enorme de, primeiro, constituir um racional, até para os próprios acionistas da Vale, porque a renúncia fiscal, no meu entendimento – inclusive como um profissional da cultura há 35 anos – é um recurso público, sim, e aliás tem empresas que não entendem dessa forma, mas a decisão de aplicar em cultura é uma decisão privada porque eu posso só pagar o imposto e pronto.

Então é uma combinação, uma inovação brasileira, e eu sempre falei isso desde que começou lá na Fundação Roberto Marinho, com o Juca Ferreira no Ministério da Cultura, uma certa discussão de criminalização dessa renúncia fiscal. O papel-jornal da imprensa tem renúncia fiscal, a indústria da cana tem renúncia fiscal, a Zona Franca de Manaus tem renúncia fiscal, do total de renúncia fiscal do Governo Federal brasileiro, de 100% de renúncia fiscal, 2% iam pra cultura, no máximo, talvez menos.

No meu entendimento a lei de cultura federal é um mecanismo inovador, poucos países têm e a gente não pode deixar se contaminar por uma discussão que não faz sentido. Tem que aprimorar? Tem. Tem que aprimorar o critério distributivo? Tem. E cada Governo faz os seus movimentos, o que é natural, mas é uma lei de Estado.

Segundo, é um modelo, conceitualmente falando, onde o Estado abre mão de arrecadar 4% dos tributos das empresas que tem imposto a pagar, que ele poderia recolher tudo e distribuir através do orçamento federal. Então o Governo permite que a sociedade civil organizada, sejam as empresas, sejam as pessoas físicas – que podem alocar, se não me engano até 6% do seu imposto pessoal a pagar, em projetos culturais – possa reforçar uma conexão distributiva com a própria indústria cultural e vice-versa. É um modelo muito contemporâneo e é um modelo arrojado que o Brasil fez nos anos 80, 90, sei lá.

Então, voltando à transparência, acho que a gente está fazendo esse exercício. Se você pedir a lista dos 170 projetos que a gente apoiou no ano passado você vai ter no dia seguinte.

EM Mas vocês precisam encontrar uma forma de colocar isso no site, não pra mim. Algumas empresas já estão fazendo isso.

HB– Boa ideia, Eduardo. Por que não colocar no site a lista de projetos? A gente divulga. É preciso ver se há alguma recomendação ou alguma razão lógica ou regulatória ou prática que possa ter um link no site, que seja. Vamos evoluir para isso? Obrigado pela sugestão, Eduardo.

EM Eu vou mandar um modelo para vocês que a gente considera ideal. Temos um aplicativo no site onde a gente analisa o investimento das empresas e o comportamento de mais de 1.200 empresas e a gente dá uma classificação de transparência de 0 a 5 estrelas. Acho que são duas só que tem 5 estrelas. E a gente tem um modelo onde, se a empresa colocar em seu site essas informações, essa empresa terá a classificação de 5 estrelas de transparência. Poucas se importam com isso.

HB – Nós não temos nenhuma razão para não ter isso no site, porque senão a gente não divulgaria. Mostrar 10 exemplos de um total de 150 e esconde o resto. Não tem razão. Primeiro, que tudo o que a gente faz ou é bacana, por ser um desses tesouros, ou é bacana por ser uma representatividade da diversidade da produção cultural brasileira, que também é outro aspecto que a gente atende nas cidades nas nossas escolhas e a chamada contribui muito pra isso.

E dentro das escolhas diretas também tem muita representatividade; às vezes a gente até tem um projeto que não passou no crivo da chamada, mas ele é tão representativo que a gente tenta ver se não faz uma análise de escolha direta porque é um projeto que às vezes o cara teve dificuldade num documento e aí já perdeu o “time” da chamada e aí vai lá com outro documento, melhora o projeto, a gente procura fazer isso para ajudar.

EME se vocês aderirem a isso, a essa transparência, é importante porque ela vai servir de exemplo para os outros. Se a Vale faz porque eu não vou fazer?

HB – Eu te agradeço, Eduardo, as tuas provocações e boas perguntas. Estou aqui à sua disposição, não apenas em nome do Instituto Cultural Vale, mas como um profissional da cultura já longevo e qualquer dúvida ou necessidade de informação está a Ana Mauro para fazer a conexão, a Marize para dar os subsídios técnicos e eu para encher linguiça aqui nas nossas conversas.

EM Foi ótimo, Hugo. Agradeço muito essa conversa e nós vamos tratá-la com carinho.

*É Editor-Chefe de VALOR CULTURAL/Marketing Cultural e Perfil de Patrocinadores, que têm entre seus propósitos dar visibilidade a bons projetos ou ações, valorizar empresas que praticam patrocínios conscientes e apontar aquelas que fingem ser o que não são no campo da Responsabilidade Social.

Para ouvir a entrevista completa, sem cortes, acesse abaixo

 

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