Hoje em dia, não basta ter bons produtos e serviços. O consumidor espera algo mais das empresas. A responsabilidade social é uma dessas expectativas que recaem sobre as companhias e, nessa hora, algumas se envolvem em iniciativas genuínas que trazem benefícios para a imagem, com impacto positivo em seus negócios e na sociedade. A diferença entre o sucesso e o fracasso é tênue, e depende dos cuidados da marca ao lidar com o assunto. A distância entre aproveitar uma oportunidade e ser oportunista é mínima, e por isso requer atenção.
Os projetos de responsabilidade social devem fazer parte das iniciativas das empresas de forma estruturada, ou seja, é necessário que companhia tenha uma equipe dedicada ao assunto e que o conheça para aplicar ações efetivas que tragam benefícios à sociedade, seja ela do entorno da empresa ou de outras localidades necessitadas. A ação deve ter uma razão de existir, estar totalmente em linha com a estratégia da empresa, ter objetivos claros e a companhia deve justificar a escolha daquele projeto em relação ao tema, aplicabilidade, localização, público e deixar explícito o resultado esperado com ela.
Neste momento de pandemia, temos visto empresas que já possuíam diversos programas de responsabilidade social se adequarem ao cenário e buscarem novas formas efetivas de ajudar as pessoas impactadas, sejam elas profissionais de saúde, comunidades de baixa renda ou público em geral. Ao mesmo tempo, há empresas que nunca tiveram um projeto social e agora tentam embarcar nessa, provavelmente por perceber que estão com menos exposição na imprensa por conta da pandemia e que veem nos projetos sociais uma forma de aparecer para o público com uma imagem de empresa socialmente responsável. Só que o público hoje está antenado, tem informação suficiente para avaliar se a marca realmente se preocupa com o social ou se está somente querendo aproveitar o embalo do assunto e aparecer na mídia.
Pode acreditar: se a sua empresa está “caindo de paraquedas” e querendo surfar na onda das boas ações sociais sem ter histórico disso, sem ter feito a “lição de casa” e sem profundidade e objetividade nas ações, o público vai perceber a falta de ligação e histórico com o tema. E hoje em dia, com as redes sociais, para a sua marca passar a ser bombardeada por críticas, desconfiança e até xingamentos é questão de segundos. Não pense que a sua empresa pode enganar o público se passando por socialmente responsável se não o for de fato. E ela vai ser desmascarada mais cedo ou mais tarde. E da pior forma: em público e perante os seus clientes e outros stakeholders.
Para saber se a sua empresa está realmente preocupada com questões sociais ou somente em aparecer com boa imagem na imprensa, é importante se perguntar antes de tudo: “minha empresa faria essa ação de responsabilidade social mesmo se ela não fosse divulgada externamente, mesmo se não houvesse reconhecimento por isso?”. Se a resposta for “sim”, é um bom indicativo para seguir. Se for “não”, mostra que não se deve dar o próximo passo – ao menos enquanto a empresa tiver essa cultura e visão de pouco envolvimento com causas sociais. Ao divulgar as ações, deve-se entender se isso é com o objetivo de ajudar mais pessoas e incentivar outras empresas a fazerem o mesmo ou se é simplesmente reforçar a imagem positiva frente ao público. Grande parte faz pela segunda razão, ainda que na maioria das vezes não seja percebido assim.
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Antes de fazer algo externo, a empresa deve olhar para dentro e ver se a prioridade não mora ali. Por exemplo, vai investir em um programa externo de responsabilidade social de incentivo a minorias? Legal, mas quantos negros, deficientes e LGBTQIA+s, por exemplo, a companhia tem em seu quadro de funcionários? Pretende fazer com que estejam mais presentes como colaboradores da empresa? Não seria mais efetivo e assertivo começar por aí? Vai lançar uma iniciativa de apoio à comunidade do entorno, mas ainda não possui um código de conduta formal e rígido e se vê envolvida em casos de corrupção? Não funciona.
Você, leitor, já deve ter visto o anúncio de inúmeros projetos sociais bancados e conduzidos por empresas, certo? Mas quantas empresas você vê divulgarem os resultados dessas ações? Certamente, esse número é uma pequena fração das que divulgam. E essa postura tem duas explicações possíveis: o projeto foi ineficiente e não alcançou os objetivos e, por isso, a empresa não quer divulgar o “fracasso”; ou a empresa só queria mesmo aparecer de uma forma positiva, sem se preocupar se o resultado da ação, que deveria ser o foco, foi positivo ou não.
Um exemplo de empresa que tentou se aproveitar da responsabilidade social durante a pandemia e viu sua estratégia (e reputação) ir por água abaixo foi uma marca de roupas famosa, que, com o discurso de que queria ajudar a população e as pessoas que estavam trabalhando durante o isolamento social, com doação de cesta básica no valor de R$ 70, colocou à venda uma máscara (“exclusiva”) por absurdos R$ 147, quando o valor normal de uma máscara gira em torno de R$ 20. Rapidamente o público identificou que a ação não tinha nada de altruísta e, sim, somente comercial. Ficou claro que a marca não estava fazendo ação social alguma, só cobrando muito caro por algo simples e repassando parte da receita. Muito mais honesto teria sido a empresa doar máscaras ou cestas básicas, não embutir no preço o valor da cesta. Se era uma doação, não deveria estar embutido no preço, certo? Logicamente, o consumidor percebeu que a ação não era verdadeira e começou a cobrar a companhia, que se viu obrigada a retirar o produto da venda. Mas o estrago na imagem já estava feito e o resultado foi certamente o inverso do que a empresa queria com a ação. Ficou claro que ela estava sendo oportunista.
E aí, você ainda acha que a sua empresa é realmente socialmente responsável ou ainda se encaixa como oportunista? Faça com que ela tenha ações efetivas, honestas e em prol verdadeiramente da sociedade (e não dela mesma). As pessoas necessitadas, a sociedade e os consumidores agradecem. E a imagem e a reputação da sua empresa, que estarão protegidas, também!
* É jornalista, especialista em gestão de Marketing e coordenador de comunicação na Alfapress Comunicações.