A propósito do artigo CEO Envia Recado Para Executivos de Empresas: Leiam!, de Gabrielle Teco, publicado aí do lado, neste canal, lembrei-me de um que escrevi em agosto de 2003 na revista Marketing Cultural Online, Edição 73, onde argumentava que a galeria de diplomas em parede de executivo não era garantia de conhecimento profundo do assunto que você foi tratar e aconselhava produtores a não ficarem tristes se algum encontro com ele terminasse frustrante. Afinal, é bem provável que seus saberes fossem superiores aos dele, mesmo que você não tivesse nenhum diploma.
Leiam esse artigo escrito há quase 20 anos e vejam se ele continua atual ou não.
Quem leva projeto cultural para ser apresentado a uma grande empresa tende a tratar com certa reverência aquela figura bem apessoada que ocupa o cargo de Diretor ou Gerente de Marketing. Afinal, para estar ali, ele deve ter muitos diplomas e, portanto, muitos saberes. Não se engane – em geral ele é despreparado para compreender corretamente o que você está levando. Trate-o com deferência, não reverência, porque a possibilidade de você saber mais sobre a empresa em que ele trabalha é maior do que imagina.
Esta era de globalização trouxe muitas vantagens e muitos males, entre eles a aura de que o diploma transforma pessoas em sábias quando o sábio nem precisa de diploma na maior parte das vezes.
Esses gênios são os mesmos que vivem inventando técnicas malucas para aumentar produtividade como levar os executivos para se balançar em cipó, subir em árvore ou escalar montanhas de madeira que os recos do Exército suam para conseguir mesmo com 18 anos – tudo em nome do despertar da competitividade. Se Einstein trabalhasse em uma empresa dessa seria demitido. Aliás, nem seria contratado por causa da idade.
Pois não basta conhecer técnicas, montar gráficos, levantar estatísticas ou falar empoladamente termos ingleses, que impressionam os incautos e identificam os da mesma turba, para exercer uma função realmente produtiva para a empresa. É preciso um tipo de formação que só os que exercitam leitura além de sua área de interesse, possuam senso agudo de observação ou intuição inata para identificar com segurança como age e reage o ser humano, a cuja raça pertence a maioria dos consumidores e a totalidade dos compradores. Àqueles, informações técnicas aprimoram suas qualidades se forem encaradas com sabedoria, que consiste em utilizar bem as que acrescentam e descartar as inúteis, que são maioria. Sensibilidade não se aprende na escola e espírito crítico pode ser despertado, mas somente naqueles que já o possuem mesmo sem saber.
Ainda são poucas as empresas que têm pessoas preparadas para traçar uma estratégia cultural adequada ao marketing global da empresa ou com informações e sensibilidades suficientes para avaliar, propor, criticar o projeto que está recebendo, assim como grande parte dos produtores ainda peca na formatação, estratégia e pesquisa sobre a empresa contatada.
É preciso entender que, em muitos casos, para se crescer, hoje, numa grande empresa, exigem-se atributos que pouco têm a ver com competência. É necessário saber evitar os intrigantes ou intrigar bem; cortar caminhos aliando-se ao chefe certo e descartar subordinados questionadores; esconder o que realmente pensa e dizer o que desejam ouvir. E, principalmente, brandir os diplomas.
Num país em que a qualidade das escolas é horrorosa, onde metade da população é pouco letrada e 40% da outra metade sabe ler mas não compreende o que se passa em volta, chega-se ao cúmulo de exigir 2º grau completo para seleção de merendeira, como acontece em Brasília. E a um diretor de Marketing valoriza-se um curso de MBA mesmo que ele positivamente não saiba aplicar bulhufas daquilo que na prática deveria saber.
Aos que já estão pensando que este artigo se destina a diminuir a importância do estudo, enganam-se. Estudo é preciso e importante até o último dia de vida. I.F.Stone, um dos mais conceituados jornalistas norte-americanos, aprendeu grego aos 70 anos para ler no original textos da Grécia Antiga e escreveu uma obra interessante, crítica e reveladora chamada O Julgamento de Sócrates (para ser jornalista, nos Estados Unidos, não é necessário diploma, como aqui).
Cursos de aperfeiçoamento, pós-graduação, especialização são sempre bem-vindos e recomendados, mas a mensagem que se quer expor neste espaço é que as empresas deveriam valorizar a competência mais que a aparência. Que a parede repleta de certificados acadêmicos não é garantia de nada até haver prova provada de que o detentor de tão insignes documentos contribui efetivamente para elevar a qualidade da empresa, aumentar vendas ou melhorar relacionamento com clientes e fornecedores.
Por isso, quando for levar um projeto cultural a alguma empresa, procure seguir o conselho que sempre damos a quem nos procura: busque o máximo de informações possível sobre ela antes de procurá-la e, de preferência, converse antes com o responsável para saber o que ele pensa. Certamente você vai encontrar alguns esclarecidos e com visão correta do que a empresa precisa e então seu caminho se tornará mais fácil. Mas vá preparado para encontrar mais dúvidas do que certezas, pois esta é a maior probabilidade.
Porque a maioria não sabe o que quer e você poderá levar uma solução, ou, o que é bastante provável, sair de lá pensando que a vida às vezes é muito injusta. Se for assim, não fique triste. Quase todos saem com a mesma sensação.
P.S. – Aviso aos navegantes: como nossa revista não é produtora, o relatado aqui é fruto de observação e não de experiências vividas.
* É Editor da revista Marketing Cultural Online.
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